terça-feira, 10 de agosto de 2010


Adiei ter que escrever isto por saber que depois desta carta seria de vez o fim. Escondi as palavras amontoadas em recantos longe do alcance das minhas mãos. Julguei que se fingisse ser um pesadelo, jamais iria ser verdade e assim não iria acabar. Mas acabou. E desde então que me refugio no amanha por saber que voltas. Mas tu não chegas e o amanha nunca vem. O tempo parou. O coração parou com ele. A pulsação perdeu-se no último suspiro do relógio, e eu cai.
Um dia jurei-te que iria permanecer fixa com raízes eternas no campo de batalha, ate a persistência me render a vitória, mas o chão desfaz-se por baixo dos meus pés, e eu não consigo mais fazer parte dele agora.
Sim tinhas razão. É veneno este fogo que me corre nas veias, são teias estes cabelos que dançam á superfície, quando o meu corpo se afunda neste mar que se torna areia. Sou um deserto agora. Não tenho mais água fresca nas palavras, nem conforto nos meus braços para te oferecer. Transfigurei-me numa miragem demasiado distante para alguém ver. E aos pouco desapareço. Olho ao espelho e só me vejo a mim.
Onde estas tu?
Invisto as minhas mãos para o vazio mas não te encontro. Procuro cravar-te de novo no meu peito… mas és pó. Foges-me por entre os dedos, e turvas o ar a minha volta. E eu choro-te. Choro-te como se chora a partida do verão. Como se chora numa despedida sem últimos abraços, sem últimos beijos, ou sem fotografias no álbum de memorias. Nunca me disses-te o que era para ti, nunca fui a razão das tuas palavras, nem a inspiração das tuas horas. Talvez quem sabe um dia me digas quais as eram as minhas cores e a música dos meus olhos… Mas não agora. Não me interrompas agora. Limpa essas lágrimas e ouve-me ate ao fim.
Hoje escreve-to estas palavras sem voz. Este som mudo que grita algo que não vais mais ouvir, pois não vou voltar a usar-te como tema dos pensamentos que partilho com a escrita. Esta é a última vez que te dei corpo na ilusão das letras. A última de todas as restantes coisas a ser ditas. E vou fazer deste o momento, no instante em que mais uma vez te escondes no mundo para fugir aos meus olhos. Vou agradecer o silêncio com todas as forças que me restam, e vou atravessar a letargia da casa… abro a porta pela qual te imaginei entrar tantas vezes e entrego-me a escuridão que me cega. Ao longe, oiço a pesada capa do nosso velho livro fechar-se para não mais ninguém ler, e abro os braços ao vento que me leva em sementes para outras terras.
Quando as primeiras chuvas vierem eu vou renascer…longe de ti e daquilo que não me deste. Longe das estrelas, longe do mar. Longe de tudo aquilo que foi escrito na lua. Longe da distância, da confusão, da ansiedade. Longe de tudo o que a minha pele pode sentir, ou as minhas mãos tocar. Longe do teu amor….

Mas sempre, desde sempre, para sempre….
Perto da tua saudade.


Encanto vs teimosia : 31 de Agosto de 2009 -Agosto de 2010